Cooperativas esperam triplicar área com cevada no Paraná

Maltaria que será inaugurada em 2023 terá capacidade inicial de produção de 240 mil toneladas/ano de malte cervejeiro. 

Para abastecer a demanda da indústria cervejeira, pesquisadores e produtores estão investindo em tecnologias que resultem na melhoria da qualidade e no aumento da produção de cevada. No Paraná, a Fundação ABC – instituição vinculada às cooperativas Frísia, Castrolanda e Capal – trabalha para garantir a matéria-prima para a Maltaria Campos Gerais, que será inaugurada em 2023.

“O principal insumo da agricultura é a informação, o conhecimento. A pesquisa é fundamental para fazer com que o empreendimento prospere”, afirma Luís Henrique Penckowski, gerente técnico da Fundação ABC.

A maltaria é um investimento das três cooperativas, em conjunto com outras três: Agrária, Bom Jesus e Coopagricola. Na frente de pesquisa, a Fundação ABC atua em parceria com a Fundação Agrária de Pesquisa Agropecuária (Fapa). A Fapa é responsável por desenvolver cultivares de cevada e a Fundação ABC, por sua vez, analisa essas cultivares e posiciona o melhor manejo dentro da área de atuação das cooperativas. “Acreditamos que, bem implementada, a cevada, de maneira geral, tem rentabilidade maior que o trigo”, explica Penckowski.

Com previsão para ter a primeira etapa inaugurada em setembro do ano que vem, a Maltaria Campos Gerais, que está em construção em Ponta Grossa (PR), eleva a expectativa da área de cevada para as cooperativas da região para duas ou três vezes mais, dentro de um a dois anos. Na safra atual, são quase 25 mil hectares de área plantada entre os produtores associados às cooperativas responsáveis pela maltaria.

Agroindústria nos Campos Gerais deve beneficiar 12 mil produtores cooperados — Foto: Fundação ABC

Agroindústria nos Campos Gerais deve beneficiar 12 mil produtores cooperados — Foto: Fundação ABC

A capacidade de produção da maltaria será de 240 mil toneladas/ano de malte cervejeiro – volume que corresponde a 15% da demanda do mercado nacional -, o que exigirá 290 mil toneladas/ano de cevada. A expectativa é que a capacidade da indústria dobre na segunda fase, passando para 480 mil toneladas/ano de malte.

Expectativa dos produtores

Os produtores responsáveis pela cevada que será direcionada para a maltaria estão distribuídos entre os municípios de Arapoti, Carambeí, Castro, Palmeira, Ponta Grossa e Tibagi, no Paraná, além de cidades do Sul de São Paulo.

O empreendimento, que está sendo construído às margens da PR-151, no Distrito Industrial Norte de Ponta Grossa, amplia a expectativa dos produtores da região. O produtor e cooperado Daniel Los, que tem propriedade entre Carambeí e Ponta Grossa, planta cevada há alguns anos. Ele aposta na cultura como uma das opções para a safra de inverno, juntamente com o trigo – e aveia em menor quantidade.

A inauguração da nova indústria traz ótimas perspectivas para ele que, atualmente, planta a cevada em 170 hectares. “Tenho planos de ampliar a área com a implantação da Maltaria Campos Gerais. É um incentivo, já que a proximidade torna o preço melhor para o produtor, com menos custo para o transporte, pois a indústria está na porta de casa”, avalia.

O produtor e engenheiro agrônomo Daniel Gustavo, que tem uma área em Carambeí, vem apostando na cevada há quatro anos. Ele também prevê ampliar a área com a cultura, que hoje é de 100 hectares. “A maltaria dará mais segurança, e o produtor vai ganhar. A tendência é que a cevada se torne cada vez mais vantajosa para nós”, acredita.

cevada
Fonte: Conab

Pesquisa de ponta

O investimento em pesquisa no setor visa garantir o funcionamento da maltaria já com vistas ao crescimento, em busca de ampliação da área plantada, qualidade da produção e sustentabilidade do processo, considerando o clima e as características da região.

“Para crescer, a pesquisa tem que estar na frente, apresentando soluções para os problemas que possam surgir. Não tenho dúvidas de que a cultura da cevada é excelente opção para o inverno e que vamos sustentá-la”, acredita Penckowski. “Será a maior maltaria da América Latina a partir da segunda fase”, completa.

A região dos Campos Gerais é considerada ideal para o cultivo de cereais de inverno, porém, a principal cultura é o trigo. Além do desafio do clima – as culturas de inverno correm um risco maior de perdas devido às geadas -, é preciso entender o manejo da cultura mais indicado para os grãos.

Distante 165 km de Ponta Grossa, Guarapuava é o principal polo da cevada no Estado, onde se planta o grão há 40 anos. “Existe uma diferença muito grande entre as duas regiões, de clima, de solo, de comportamento desses materiais”, adverte o gerente da Fundação ABC.

Segundo dados da Secretaria de Estado de Agricultura e Abastecimento (Seab), o núcleo de Guarapuava registrou uma área de 45,7 mil hectares de cevada na safra 2021/22, representando 54% na área estadual ocupada pela cultura. A estimativa de produção é de 221,7 mil toneladas de cevada.

Rogério Nogueira, engenheiro agrônomo do Departamento de Economia Rural (Deral), da Seab, explica que, na safra anterior, das 189,9 mil toneladas produzidas nos municípios que compõem o núcleo de Guarapuava, entre 95% e 96% da produção foi classificada para maltaria. Já no núcleo de Ponta Grossa, das 77,6 mil toneladas de cevada produzidas na safra 2020/21, quase 80% não se classificou para a maltaria.

Os produtores ouvidos pela Globo Rural, que têm propriedades na região dos Campos Gerais, garantem que boa parte do grão produzido em suas terras é classificada para a produção cervejeira. “Praticamente 100% da minha produção é classificada. Penso que esse resultado, um pouco é sorte. E também está relacionado ao acompanhamento técnico, ao posicionamento, à época do plantio, o que ajuda a evitar a doença giberela”, avalia Daniel Gustavo.

A giberela, causada pelo fungo Gibberella zeae (Fusarium graminearum), é o principal problema que afeta as espigas de lavouras de trigo, cevada e triticale na região. Daniel Los também tem a produção, em geral, classificada para a maltaria, mas demonstra preocupação em relação à safra atual. “Estou estimando uma perda em torno de 30% da produção, por causa das chuvas”, acredita.

Cevada no Brasil

Safra Área (em mil ha) Produtividade (em t/ha) Produção (em mil t)
2022 118,8 4,182 496,8
2021 111,5 3,812 425
2020 103,4 3,621 374,4
2019 118,8 3,612 429,1
2018 111,9 3,159 353,5
2017 108,4 2,602 282,1
2016 95,6 3,921 374,8
2015 126,6 2,568 263
2014 117,2 2,606 305,4
2013 102,9 3,510 361,2
2012 102,8 2,494 287,2
2011 88,4 3,451 305,1
2010 87,9 3,230 283,9

Potencial

O consultor Marco Antônio Dávila Fernandes, sócio-diretor da Sólida Agroconsultoria, que atua na região, considera que a área tem “potencial altíssimo para a cevada”. Ele explica que o grão exige frio e altitude alta, com lavouras com mais de 800 m de altitude. “Aqui, a altitude fica entre 800 m a 1.200 m de altitude, é excelente”, observa. E acrescenta: “a produtividade é em torno de 15% a 20% maior que a do trigo”.

A qualidade de cultivares de cevada produzidas na Europa, importadas pelo Brasil da Alemanha e da República Tcheca, garantem mais produtividade e percentual baixo de problemas relacionados à proteína no grão – o que garante o perfil exigido para a produção de malte.

“É uma cultura com potencial produtivo maior e que entrega mais, pois é mais tolerante ao frio e à geada”, explica Fernandes. Por causa dessas características, a cevada também pode ser plantada um pouco mais cedo que o trigo, permitindo ao produtor antecipar o plantio da soja de verão lá na frente.

Entre as recomendações do consultor para o plantio de cevada, o primeiro aspecto é a escolha de uma área com alta fertilidade. Em seguida, está o controle da dose de nitrogênio. “Não pode ser muito, se carregar demais vai dar proteína alta e o grão será condenado para a maltaria”, enfatiza.

Atualmente, as próprias cooperativas direcionam as cultivares mais indicadas conforme a área de plantio. Para a região de Ponta Grossa, por exemplo, a aposta é a cultivar Imperatriz. A dose de nitrogênio é calibrada, com a aplicação na base. Além disso, a colheita deve ser realizada dentro dos percentuais toleráveis de umidade.

A cevada é a matéria-prima do malte – principal ingrediente da cerveja. Rogério Nogueira, do Deral, explica que o padrão cervejeiro do grão da cevada, conforme portaria do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), precisa conter: umidade máxima de 13%, proteína máxima de 12% e poder germinativo mínimo de 95%.

Padrão cervejeiro do grão da cevada deve conter umidade máxima de 13% e proteína máxima de 12% — Foto: Pixabay

Padrão cervejeiro do grão da cevada deve conter umidade máxima de 13% e proteína máxima de 12% — Foto: Pixabay

Viagem técnica à Argentina

Penckowski, gerente técnico da Fundação ABC, explica que estão sendo pesquisadas as melhores ferramentas de manejo para entregar um pacote de informações ao produtor, com foco em aumentar a produtividade da cevada na região e de acordo com a qualidade que a maltaria espera. “As pesquisas abrangem diferentes áreas, como controle de doenças e fertilidade do solo”, comenta.

Uma comitiva com representantes da Fundação ABC, da Fapa e das cooperativas envolvidas no projeto da Maltaria Campos Gerais esteve na Argentina, no mês de novembro, para conhecer de perto a produção de cevada na região. “Rodamos o sul da província de Buenos Aires, que tem uma produtividade de cevada muito alta – o dobro da alcançada aqui”, conta Penckowski.

Os integrantes fizeram uma imersão técnica para observar o que os produtores argentinos estão fazendo e visitaram centros de pesquisa para conhecer as técnicas de manejo utilizadas por eles.

Brasileiros visitaram lavouras e centros de pesquisa do país vizinho para conhecer manejo — Foto: Fundação ABC

Brasileiros visitaram lavouras e centros de pesquisa do país vizinho para conhecer manejo — Foto: Fundação ABC

Expansão

A área de cevada no Brasil teve variação de 6,5% entre as safras de 2021 e 2022, passando de 111,5 mil ha para 118,8 mil ha. Quanto à produtividade, o aumento foi de 9,7%, passando de 3,8 mil kg/ha em 2021, para estimados 4,2 mil kg/ha em 2022. A produção do grão também cresceu, com variação de 16,9%, passando de 425 mil toneladas em 2021 para produção estimada em 496,8 mil toneladas em 2022. Os dados são do 2º levantamento Grãos – Safra 2022/23, da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).

Em 2021, o Paraná representou 71% da produção nacional de cevada. Foram produzidas 301,6 mil toneladas do grão numa área total de 76,2 mil ha. Para a safra 2021/22, a estimativa de produção é de 379 mil toneladas, em uma área de 84,3 mil ha – um aumento de 26% na produção e de 10% na área, de acordo com dados da Seab.

A maior parte da produção da cevada no Paraná tem sido exclusivamente para consumo na indústria cervejeira. A liderança do Estado deve-se ao potencial da região somado aos investimentos em pesquisa, tecnologia e indústria.

A Agrária, localizada em Entre Rios, distrito de Guarapuava, é a maior maltaria da América Latina e tem como carro-chefe a produção de Malte Pilsen, atendendo a aproximadamente 30% da demanda do mercado brasileiro de cerveja. Com 680 cooperados, o faturamento da cooperativa foi de R$ 6,5 bilhões em 2021. Na Maltaria Campos Gerais, os investimentos na primeira fase somam R$ 1,5 bilhão, podendo chegar a R$ 3 bilhões até a conclusão da segunda etapa.

Fonte: Globo Rural

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